Foi num sábado à noite. Lá pelas tantas, Tonhão estava lá, como sempre, agarrado no seu computador. Navegando para baixo e para cima, no dolce far niente. Aí o pé coçou. Deu vontade sair de casa e dar um bordejo por aí. Pois ninguém é de ferro.
Consultando sua consciência, como sempre apareceram dois anjos: o bom e o mau.
O anjo bom dizia candidamente que Tonhão deveria ficar em casa descansando, navegando na internet, assistindo à televisão. Quem sabe até rezando terço. Quantos conselhos bons!
O anjo mau dizia que ele devia sair pras quebradas, pras baladas, atrás de um RS - rabo de saia. E esse negócio de descansar, deixasse para quando morresse. Aí, sim, descansaria pela vida eterna, amém! Enquanto o anjo bom tinha asinhas às costas, um halo de luz sobre a cabeça e portava uma Bíblia que ele consultava de vez em quando, o anjo mau tinha um tridente e ameaçava espetá-lo na bundinha do anjo bom. Além de ter ainda chifre e rabo. Seria o anjo mau um cornudo!
E Tonhão pensava! E pensava! A mente em turbilhão. É mais fácil seguir um mau conselho que um bom conselho. Um convite para ajudar a encher uma laje é barra. Mas um convite para tomar cerveja e apreciar o vaivém das formas calipígias das morenas é muito melhor. Mais saudável, inclusive!
Tonhão não resistiu à tentação. Seguiu o conselho do anjo mau. Enquanto Tonhão foi trocar de roupa, o anjo mau aproveitou pra botar pra correr o anjo bom, espetando a bundinha dele com o seu tridente.
Tonhão desceu até a garagem de seu prédio, pegou seu carro e saiu. Sem carro, hoje em dia, não se pega mais nem resfriado - segundo um dos sete sábios da Grécia antiga. Foi logo para um dos points da cidade. Andou pelo estabelecimento para ver e ser visto. A famosa volta olímpica.
Eis que de repente, não mais que de repente, de repentemente, Edelweiss chama-o e ele vai cumprimentá-la. Edelweiss, ascendência alemã, louríssima, faces rosadas e olhos azuis. Linda nos seus gloriosos 52 aninhos que dizia serem apenas 42. Inclusive, despachara o terceiro marido há pouco tempo. Mas já com fôlego para mais um.
- Sente-se aqui comigo, Tonhão, pediu-lhe depois de dois beijinhos na face.
Tonhão, sem se fazer de rogado, sentou-se. Aí a conversa começou. Um vinhozinho para aquecer o coração e o resto também. Foram dançar de rostinho colado, igualzinho antigamente. Muitos boleros. E aquilo foi fondo, foi fondo, noite a dentro. Edelweiss ali toda compenetrada e vivenciando cada estrofe: “Esperame en el cielo, corazón...”
Surgiu um impasse: “Como cantar uma amiga? Coisa mais chata. Mas, como não tem tu, vai tu mesmo!”
- Edelweiss, já está bem tarde, por que não vamos embora?
- Tudo bem! Está muito frio. Nem o vinho conseguiu me aquecer, disse Edelweiss com um sorriso meio maroto.
- Pois é, vamos agora e amanhã pela manhã podemos passear de mãos dadas em volta da lagoa da UFV, contemplar os ipês floridos e as bungavíleas. Você topa, Edelweiss?
- Claro que eu topo, Tonhão!
- Que que eu devo fazer amanhã cedo, Edelweiss? Te cutuco ou te telefono?
- Me cutuca, é claro! Tô num atraso feio!
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